sábado, 11 de dezembro de 2010

Álbum De Figurinhas

 
Uma vontade cortante de rasgar as janelas e costurar as paredes. Fazer o inverso no inverno, sair queimando o mar, chamar pelo perfume quem não se lembra mais do nome. Tomar banho de roupa, escrever com o papel no lápis, correr contra as próprias pernas. Trazer a loucura para dentro e o amor para fora.

Porque loucura é a habilidade de se ilimitar.

Chega uma hora que você cansa de se cansar. Cansa de procurar o que nunca se perdeu, o que nunca se esqueceu. Busca uma forma de encontrar respostas. Mas você não quer respostas, quer “a” resposta. Lê jornais. Espera que a resposta esteja na capa de um livro, que seja a manchete do dia, que seja a última e a mais emocionante reportagem da tevê. Em último caso, recorre à sessão de horóscopo. Qualquer folheto agasalha as mãos. Qualquer letreiro pifado amarra os cílios. Bate um desespero.

Passa a escrever aleatoriamente, porque o que mais vale é preencher o rosto no papel. Casa palavras que nunca se compreenderam exatamente para forçar um romance. Não sairá um romance. Não são as palavras que fazem um romance, elas são apenas o que restou dele. As palavras são nossos filhos. Uma civilização nova da pele.

Você já gastou horas reformulando as perguntas, refez os cálculos, não tinha como ter dado errado: era para estar aqui, do seu lado, com os sapatos cheios de areia em cima da cama. Você tirou uma folga, foi à igreja, fez as compras, foi à feira, colocou a roupa no varal e, mesmo assim, sente que falta algo. As roupas não se vestiram de sol.

Perdeu as chaves do carro, da casa, do armário. Pegou o ônibus das seis. Mas não consegue andar sobre os próprios pés, perde o rumo ao repensar que caminho pegou ontem. Anda no automático. Volta ontem para tentar entender hoje.

Porque acredita que um dia chegará, que esbarrará com ele em uma esquina. Acredita que um dia vai acontecer e que você será mais do que uma boca cansada e olhos exaustos.

Porque você já fez todos os cursos necessários. Perdeu, conheceu, amou muitas pessoas... Tem experiência de sobra para voltar a ser, pra deixar de ser e se tornar outro. É como ter um álbum de figurinha, faltando apenas uma, uma figurinha, aquela bendita figurinha que nunca vem.

E você continua esperando. É a mesma ansiedade das férias do trabalho. Contará cada dia como quem come amendoim: cada um será um grão valioso.

Passaremos a vida esperando a tal figurinha.

Porque mais do que a figurinha que falta, o amor é o que fica do álbum.

Leandro Lima

Um comentário:

Luzia Medeiros disse...

Estou com meu album, e a figurinha infelizmente não encontrei. As vezes penso que falta amor nas pessoas. Mas pq? Ele só machuca quando acaba, mas enquanto vive nos faz tão plenos! Vamos indo né, Leandro! Ele vai chegar. Lindo texto! Bjs