quinta-feira, 9 de junho de 2011

Hino Diário

Imagem da série: Abstrato


Com dificuldade vamos vivendo. Vamos perdendo e ganhando amores; mais perdendo bingo do que ganhando (nem o frango do bingo da igreja conheceu nossa sorte). A sorte não anda perdida pelo armário. Vamos calejando as mãos e espremendo as mangas; um sumo necessário pela sobrevivência, um esforço diário. 

Com destreza vamos administrando as conta, os deveres e a paciência. Vamos tirando dali e colocando um pouquinho aqui, vamos cogitando que será melhor, que ficaremos bem, que seremos melhores, que estaremos melhores amanhã. Vamos postergando toda dor. E quem diria que viver seria tão difícil. Brincar de ser “gente grande” cansa! 

Tenho saudade da infância: a melhor fase de nossas vidas, quase que um estado cabalístico, um estado metafísico, muito além da realidade, as cores tinha mais cor, natal ainda tinha cheiro de roupa nova e de bola de futebol... Não medíamos esforços para o futebol descalço, depois dava um jeito nos calos. Ouviria uma semana a mãe reclamando, mas, assim, a mãe estava sempre por perto. 

Na infância, não tínhamos obrigações, responsabilidades, valia apenas as travessuras, quebrar os brinquedos com outros brinquedos, fazer moicano no cabelo com xampu, trocar figurinhas repetidas e andar de bicicleta. Fazer um bilhete para o amor de escola que nunca foi lido; qualquer fracasso era logo compensado com nova tentativa. Valia arriscar a reputação: tímido entre oferecer os lábios ou a pipoca no cinema. 

Encarávamos o mundo com imaginação, com volúpia, com fantasia. Íamos pelo quintal do pior para não fazer alarde, na ponta do pé, rangendo somente a porta dos olhos. A solução vinha antes da coçadinha na cabeça. 

Hoje, só dá para começar pelo bolso. Porque, antes, era só chorar que ganhava o boneco irado do desenho ou o carro de controle remoto. Hoje, nem chorando sangue você consegue pagar o carro, a água, o telefone... Daqui a pouco inventam crediário até para o amor, cupom de desconto e financiamento para qualquer paixão. 

Algumas coisas perderam o sentido, perderam o gosto, o cheiro. Não nos permitimos à enfermidade, negamo-nos à doença, a tudo o que for nos tirar dos eixos e quebrar a rotina necessária. Nada pode bagunçar as finanças. Arrancaremos os cabelos, perderemos o sono se sumirem os nossos números e vírgulas do banco. 

Não conseguimos encarar o mundo. Andamos enfileirados, soldados, acorrentados às coisas. Não somos mais tão astutos quando criança. Já perdemos metade de nossas vidas. A outra metade está em estágio probatório, em análise para saber se temos direito à felicidade. 

Duvido se você ainda sabe andar de bicicleta.

Leandro Lima

2 comentários:

Vanêssa Aulette disse...

Saudades de quando a careta dos meus pais era a coisa mais engraçado do mundo...

Sentí falta dos seus posts. Plz, não deixa a gente aqui na saudade (:

PS.: Eu ainda sei andar de bicicleta!

Marinete disse...

oi seu blog continua lindo!
eu ainda sei andar de bicicleta, como dizem quem aprende nunca esquece... mas cai! rsrsrsrs ^^
Beijos ;*